As reinternações hospitalares ou readmissões hospitalares representam um problema constante nos hospitais, pois se não identificadas, medidas e controladas suas causas podem aumentar os riscos para os pacientes e prejuízos financeiros para as instituições.

Reinternação hospitalar é o termo utilizado pela Agência Nacional de Saúde (ANS) para referir-se ao cálculo do retorno do paciente em até 30 dias após o recebimento da alta.

Estudos na literatura calculam a reinternação em 28 a 30 dias identificando taxas que variam de 5 a 25%, usando a seguinte fórmula: (nº de reinternações no período / nº de total de saídas no período) × 100.

Estudos demonstram que as taxas variam de 18 a 25%, para doenças cardiovasculares e respiratórias, principalmente nos pacientes acima de 60 anos de idade, onde estão presentes as comorbidades, representando um custo adicional ao sistema de saúde.

A taxa de reinternação após a alta hospitalar caiu de 21,9% em 2019 para 17,1 % em 2020 e 16% em 2021, segundo dados da Fundação Getúlio Vargas.

Os gastos com reinternação são tão expressivos, que o pacote de medidas conhecido como Obamacare, nos EUA desde 2012, determina que as reinternações sejam oneradas ao hospital, que “deve tratar bem o paciente desde a primeira vez”.

A literatura demonstra vários fatores responsáveis pelas reinternações hospitalares.

Reinternação hospitalar por mães adolescentes

Refere-se ao fenômeno de mães adolescentes que retornam ao hospital após o parto ou cuidados pós-parto.

Pode ocorrer devido a complicações durante o parto, falta de apoio familiar, falta de educação sobre cuidados com o bebê e fatores socioeconômicos.

O objetivo é reduzir a reinternação por meio de programas de educação, apoio social e acesso a serviços de planejamento familiar.

Reinternação hospitalar por determinantes sociais

Envolve pacientes que retornam ao hospital devido a problemas de saúde relacionados a determinantes sociais, como pobreza, falta de moradia, alcoolismo, acesso limitado a alimentos saudáveis, dificuldade no acesso aos medicamentos e educação precária.

Os determinantes sociais têm um impacto significativo na saúde, e a reinternação frequente pode ser um reflexo desses problemas subjacentes.

Abordagens interdisciplinares são necessárias para lidar com essa questão, incluindo a cooperação entre serviços de saúde e assistência social.

Reinternação hospitalar precoce

Refere-se a pacientes que retornam ao hospital em um curto período após a alta médica inicial.

Pode ocorrer devido à alta hospitalar prematura, falta de continuidade dos cuidados, falta de aderência ao tratamento ou complicações não identificadas anteriormente. Pode ocorrer também em situações em que o atendimento intra-hospitalar não foi de qualidade adequada.

É importante melhorar a coordenação dos cuidados, orientações aos pacientes e o acompanhamento após a alta para prevenir reinternações precoces.

Reinternação hospitalar por doenças crônicas

Envolve pacientes com doenças crônicas, como insuficiência cardíaca, doença pulmonar obstrutiva crônica (DPOC) e diabetes, que retornam ao hospital devido a complicações ou exacerbações dessas condições, normalmente acontece quando os pacientes não seguem as recomendações necessárias ou não aderem ao tratamento farmacológico e não farmacológico.

A gestão adequada das doenças crônicas envolve educação do paciente, aderência ao tratamento, monitoramento regular e intervenções preventivas.

Programas de cuidados coordenados e transições eficazes de cuidados podem reduzir as reinternações por doenças crônicas.

Em todos esses cenários, a prevenção da reinternação hospitalar envolve uma abordagem holística que leva em consideração fatores médicos, sociais e de estilo de vida. A coordenação dos cuidados e a promoção da saúde são fundamentais para minimizar as reinternações e melhorar a qualidade de vida dos pacientes.

Diante deste cenário a importância das certificações de qualidade nas instituições hospitalares é fundamental para contribuição da diminuição das taxas de reinternação hospitalar, e também para um bem maior, para melhoria da qualidade, segurança, eficácia dos serviços de saúde e principalmente para os pacientes, onde, nestes processos de certificação, os profissionais de saúde são orientados a envolvê-los em seus respectivos cuidados, ou seja, realizam um planejamento de alta estruturado e adequado para cada tipo de paciente , de acordo com suas condições sociais e ambientais, onde  são informados quanto ao conhecimento de  sua patologia, tratamentos, cuidados, recomendações, entre outras informações, tanto no período intra-hospitalar, quanto às informações relativas ao autocuidado em seu domicílio. Claro que temos situações, como citadas anteriormente, que podem agravar o quadro dos pacientes, como fatores sociais e ambientais, daí a importância de o poder público investir nestas situações, com acompanhamento e visitas de profissionais de saúde a estes pacientes mais vulneráveis, oferecendo um cuidado centrado no paciente, verificação do acesso e aderência dos medicamentos, assim como o seguimento das recomendações.

Alguns estudos internacionais, demonstram alguns dados referentes a reinternação hospitalar:

  • Hollaway, Thomas e Shapiro (1998). Aproximadamente um quarto dos gastos com internação no MEDICARE são devido a reinternações que acontecem dentro de 60 dias da alta hospitalar. Altas taxas de reinternação podem ser por má qualidade de atendimento. As principais doenças neste estudo foram Insuficiência Cardíaca (IC), Diabetes Melitus e Doença Pulmonar Obstrutiva Crônica (DPOC).
  • Ashton et al, declarou em um estudo que a reinternação dentro de 31 dias após a alta está ligada ao processo de tratamento intra-hospitalar, que aumenta o risco de reinternação em 55% se este tratamento foi relativamente de baixa qualidade.
  • Kossovsky et al (2000), para pacientes com insuficiência cardíaca, com reinternação após 31 dias após a alta, demonstrou uma taxa de 7,1%. Neste caso o fator determinante foi um preparo subótimo da alta hospitalar e não teve relação com a qualidade no atendimento intra-hospitalar e que as características clínicas e demográficas dos pacientes foram fatores determinantes para este fato.
  • Em um grande estudo realizado por Westert et al (2002), foram apresentados dados de três países europeus (Finlândia, Escócia e Holanda) e três estados americanos (Nova York, Washington e Califórnia), e tinha como objetivo analisar se as taxas de reinternação diversificam entre causas de internação e populações e se a duração da internação está inversamente relacionada com as taxas de reinternação. As doenças selecionadas foram: Insuficiência Cardíaca, Diabetes, Doença Pulmonar Obstrutiva Crônica, (DPOC), Asma, Ataque Cardíaco e alguns procedimentos cirúrgicos. Os resultados deste estudo demonstraram que a Insuficiência Cardíaca e DPOC foram responsáveis pela maior taxa de reinternação na Europa 10,9% do que nos EUA 8,1%.
  • Halfon et al (2002), reportou em um estudo, que a taxa de reinternação nos hospitais suíços é em torno de 5%.
  • Dados de Heggestad (2002), em hospitais na Noruega para pacientes com idade acima de 65 anos de idade ou mais, a taxa foi de 8,57%.
  • Lagoe et al (2001), obteve uma taxa de 9% em um hospital de Nova York.

Um estudo brasileiro realizado por Rocha, Simões e Guedes (1997), teve foco na comparação de pacientes do SUS, medicina de grupo e pacientes particulares, em relação às taxas de reinternação. Os resultados deste estudo demonstraram que os pacientes com mais de uma internação no ano, foi maior para a categoria medicina de grupo, 16,4%, pacientes do SUS com taxa de 16,3% e nos pacientes da categoria particular a taxa foi de 11,1%. Neste estudo foram contabilizadas todas as repetições de reinternações ao longo do ano.

Em um trabalho publicado na Revista Brasileira de Enfermagem, fazendo uma relação entre o autocuidado e reinternação de pacientes com insuficiência cardíaca, demonstrou-se que quanto menor for o conhecimento do paciente em relação à sua doença de base, maior o número de internações por IC descompensada, e que esta doença é responsável por 21,6% do total das reinternações hospitalares, sendo neste estudo a maioria do sexo masculino e com idade acima de 61 anos. Isso demonstra a importância das orientações, educação, conhecimento, envolvimento do paciente em sua doença de base e em seu tratamento.

Seguem algumas recomendações para mitigação e diminuição das reinternações hospitalares:

  1. Integração de Dados de Saúde: A integração de sistemas de registros médicos eletrônicos e o compartilhamento de dados entre hospitais e clínicas podem melhorar a continuidade do cuidado, reduzindo erros e reinternações desnecessárias.
  2. Telemedicina e Monitoramento Remoto: A telemedicina e o monitoramento remoto estão sendo utilizados para acompanhar pacientes após a alta, identificar precocemente complicações e ajustar tratamentos, reduzindo assim a necessidade de reinternações, principalmente relacionadas à adesão dos pacientes aos medicamentos e o seguimento das recomendações médicas.
  3. Sistemas de Alerta: Os sistemas de alerta automatizados podem ajudar a identificar pacientes em risco de reinternação, permitindo a intervenção precoce e o ajuste de tratamentos.
  4. Programas de Gerenciamento de Transições de Cuidado: Concentram-se especificamente em garantir uma transição suave de cuidados do hospital para o ambiente domiciliar, com visitas de acompanhamento e coordenação de cuidados.
  5. Uso de Aplicativos e Tecnologia Móvel: Aplicativos e dispositivos móveis (smartphones, smartwatches) estão sendo usados para educar os pacientes, lembrá-los de tomar medicamentos e monitorar sua saúde após a alta hospitalar.
  6. Apoio Psicossocial: O suporte psicológico e social pode desempenhar um papel importante na prevenção de reinternações, especialmente em pacientes que enfrentam estresse emocional, ansiedade ou isolamento social.
  7. Programas de Medicina Preventiva: Concentram-se na prevenção de doenças. Vacinação, rastreamento e triagem regular, podem reduzir a necessidade de reinternações relacionadas a complicações evitáveis.
  8. Medicina Personalizada: Abordagens de medicina personalizada, que levam em consideração as características genéticas e fisiológicas individuais dos pacientes, podem resultar em tratamentos mais eficazes e menor risco de reinternação.
  9. Programas de Reabilitação: Programas de reabilitação física e ocupacional podem ajudar pacientes a se recuperarem completamente após procedimentos cirúrgicos ou eventos médicos, reduzindo assim a probabilidade de reinternação, principalmente em pacientes com doenças cardiovasculares.
  10. Parcerias com Farmácias e Profissionais de Saúde Comunitários: Parcerias com farmácias locais e profissionais de saúde comunitários podem garantir que os pacientes tenham acesso a medicamentos e cuidados de acompanhamento adequados, envolvendo o poder público e facilitando o acesso aos medicamentos aos pacientes com mais necessidades.
  11. Treinamento de Profissionais de Saúde: A importância do treinamento contínuo de profissionais de saúde para garantir que eles estejam atualizados com as melhores práticas e possam prevenir erros médicos que levam a reinternações, e realizar um planejamento de alta eficaz.
  12. Envolvimento dos familiares do paciente durante a alta: O envolvimento tanto do paciente quanto dos familiares é importante nos cuidados pós-alta, pois o seguimento das recomendações e a adesão ao tratamento reduzirá a taxa de reinternações.

Em suma, a reinternação hospitalar é um desafio significativo que sobrecarrega o sistema de saúde e impacta negativamente a qualidade de vida dos pacientes. Para mitigar esse problema, é crucial adotar abordagens preventivas, como cuidados continuados, monitoramento pós-alta e educação do paciente e familiares, utilização de ferramentas da qualidade, aplicar novas metodologias, como Lean Healthcare, além de melhorar a coordenação entre os profissionais de saúde e promover a conscientização sobre a importância do autocuidado. Reinternar o paciente é Muda (desperdício na terminologia do Lean) e deve ser eliminada, por isso ele deve ser bem tratado da primeira vez, com um atendimento de maior qualidade.

Essas medidas, quando implementadas de forma eficaz, têm o potencial de reduzir as taxas de reinternação, melhorar os resultados clínicos e proporcionar um sistema de saúde mais eficiente e centrado no paciente.

Referências Bibliográficas

  • Teston EF, Silva JP, Garanhani ML, Marcon SS, Reinternação Hospitalar Precoce na Perspectiva de Doentes Crônicos, 2016, Universidade Federal do Ceará.
  • Merli, Ana Paula Delgado ,2007, Reinternações no Hospital De Bauru.
  • AC Linn, K Azzolin, Souza MN,2016, Associação entre Autocuidado e reinternação hospitalar de Pacientes com Insuficiência Cardíaca.
  • LM Hayakawa, Schmidt KT, Rosseto EG, Souza SNDH, Bengozi TM, 2010 Incidência de Reinternação de prematuros com muito baixo peso nascidos em um hospital universitário.